Na apresentação à edição brasileira da obra A autonomia de professores, Selma Garrido Pimenta traça um rápido panorama do contexto social neoliberal no país e faz uma breve análise da trajetória profissional dos docentes, responsáveis por conduzir o processo ensino-aprendizagem na nova sociedade da informação e do conhecimento. Ressalta, assim, a importância e pertinência do tema para a reflexão dos educadores brasileiros.
Na obra em questão, Contreras discute
a autonomia dos professores, conforme os múltiplos sentidos que o termo assume
em diversos contextos, as concepções educativas aí defendidas e o papel
desempenhado pelos professores em cada circunstância. Aprofunda o significado
de autonomia, quanto ao seu papel em relação à educação e em relação à
sociedade e anuncia, já na introdução, que acredita na parceria
professores/sociedade unindo esforços em busca da conquista de sua autonomia
conjunta.
A obra está dividida em três partes.
Em um primeiro momento, o autor aborda o profissionalismo no ensino e analisa o
debate sobre a proletarização do professor, as diferentes maneiras de
compreender o que significa ser profissional e as ambigüidades e contradições
escondidas na construção da profissionalidade. Na segunda parte, Contreras
apresenta os três modelos tradicionais dessa profissionalidade – o professor
como técnico, o ensino como uma profissão de caráter reflexivo e o papel do
professor como intelectual crítico – com o objetivo de analisar as várias faces
da autonomia em cada uma delas. Na última parte, o autor explicita o
significado de autonomia em sentido amplo, alertando sobre a importância de se
equilibrarem necessidades e condições de trabalho docente. Nesse sentido,
Contreras ressalta ser fundamental considerarem-se não só as condições pessoais
do professor, como também as condições estruturais e políticas em que a escola
e a sociedade interagem, e como esses fatores influenciam a construção da
autonomia profissional docente. Ainda, retoma as reformas educacionais
ocorridas na Espanha e aponta o papel relevante que a autonomia assume, nesse
contexto. Analisando tais reformas, o autor denuncia não só as motivações
políticas que as desencadearam, como também a ideologia que subjaz nas
mudanças: antecipar-se para perpetuar quanto ao controle do trabalho do
professor. Em vários capítulos, Contreras enfatiza que há um movimento em
sentido contrário às forças hegemônicas, em que os professores lutam para
conquistar sua autonomia, em nome do componente ético de seu trabalho, de sua
responsabilidade e de seu compromisso social. Finalmente, o autor afirma que
será alcançada, de fato, a autonomia profissional à medida que se consolidar a
autonomia social.
Como era de se esperar, para analisar
a temática da autonomia, Contreras não está só nesta empreitada teórica. Busca
a contribuição de vários teóricos da educação, entre os quais citam-se: Smyth,
Gimeno, Hargreaves, Gadamer, Schön, Bernstein, Apple, Fernández Enguita,
Stenhouse, Popkewitz. Seja a abordagem de Stenhouse sobre o professor
pesquisador ou Schön defendendo a perspectiva do professor reflexivo, Contreras
transita com segurança entre a sua idéia e as várias convergências e
divergências com os aludidos autores.
Um grande desafio proposto na obra “A
autonomia de professores” refere-se aos modelos de participação pública na
definição do currículo da escola. Especialmente, nas escolas públicas, os pais
têm delegado à equipe escolar a competência de se definir o melhor currículo
para seus filhos. Esse modelo requer um exercício constante, por parte dos
professores, debatendo e, assim, contribuindo para a conscientização da família
sobre esta responsabilidade compartilhada e nunca solitária. Outro exercício
imprescindível, proposto pelo autor, é que o professor instigue a discussão,
nas reuniões pedagógicas e nos conselhos de escola, sobre o novo sentido
político que orientará as suas ações, na sala de aula. Nesse percurso, o
docente começará a refletir sobre o sentido de suas práticas e sobre a
necessidade de se construir criticamente um novo trabalho intelectual a serviço
da transformação social. Este é o ponto de partida para a emancipação pessoal e
coletiva da sociedade.
À medida que o autor vai
desenvolvendo suas idéias, didaticamente retoma capítulos anteriores. Por
exemplo, ao encerrar o capítulo II, faz um breve resumo deste e do conteúdo
abordado no capítulo I. Depois, ao explicitar as competências profissionais e
debate social, dialoga com o leitor, apontando o resumo do percurso já
trilhado, na obra, sobre a autonomia de professores (p. 212). Esse é um recurso
interessante para manter vivo o raciocínio sobre o encadeamento do tema. Por
outro lado, há um fator que pode dificultar a leitura do livro: os muitos erros
de concordância, de acentuação, de regência, entre outros. Percebe-se que é
necessário proceder a uma outra revisão do texto, uma vez que a obra, sendo tão
rica em conteúdo, merece esta lapidação.
Falar sobre a autonomia docente
demanda conhecimento do tema e ousadia, pois, em um primeiro momento, tem-se a
impressão de que o professor é a parte mais fraca nas relações de poder e que,
por isso, não vai ser modificada a situação; por outro lado, serve como
estímulo para que os professores se organizem. De qualquer forma , este
contraste não apequenou a discussão; ao contrário, Contreras conseguiu
discorrer sobre a autonomia de professores com muita sabedoria e visão crítica.
Elucidou dúvidas, e, sobretudo, denunciou armadilhas e anunciou possibilidades
de desfazê-las. Abriu caminhos para novas pesquisas. Assim, torna-se leitura
obrigatória para estudantes das licenciaturas, da pedagogia e dos cursos de pós-graduação.
Resenha Elaborada:
NILZA CONSUELO ALVES PINHEIRO
Mestranda em Educação. Universidade de Uberaba, UNIUBE